sexta-feira, 27 de maio de 2011

Contato Improvisação: Uma busca através desta prática corporal.



A prática do contato/improvisação surge para mim como uma possibilidade da utilização do corpo, do meu corpo e do corpo do meu parceiro, para a criação de uma arte feita em conjunto, com corpos que através de formas e movimentos constroem uma significação, uma dramaturgia. São movimentos de dois corpos que propiciam diversas leituras, para quem vê e para quem realiza os movimentos do contato.
Ao escrever sobre quem vê o movimento, falo pela minha experiência de espectadora, assistindo a demonstrações e práticas de contato, para mim é inevitável perceber uma dramaturgia entre os movimentos realizados pelos corpos no espaço. Já no âmbito de praticante do contato, acredito muito na utilização desta prática corporal na criação do ator. A prática pela repetição do movimento, da técnica,  possibilita a construção e manutenção de um corpo ativo e resistente, lidando com a sustentação de pesos, trabalhando apoios e desequilíbrios, na qual mesmo os momentos de leveza exigem um corpo muito presente e ativo, o que é bastante enriquecedor no trabalho corporal do ator. Segundo Barba:

a vida do ator e do bailarino é baseada numa alteração de equilíbrio. Quando ficamos eretos, nunca estamos imóveis mesmo quando parecemos estar; estamos, de fato, usando vários pequenos movimentos para deslocar nosso peso. Uma série continua de ajustes movimenta nosso peso, primeiro nos dedos, depois nos calcanhares, agora no lado esquerdo, depois no lado direito dos pés. (BARBA, 1995, p. 10).


Barba traz a questão da alteração do equilíbrio quando fala na busca do ator por um movimento extracotidiano, criando “diferentes tensões...[que] obrigam o corpo a encontrar um novo ponto de equilíbrio” (BARBA, 1995, p. 10). A prática do contato proporciona ao ator/bailarino, através dos apoios e pesos, a descoberta de um novo equilíbrio, há uma organização diferenciada do corpo buscando se “encaixar” no corpo do colega. Nessa busca ativamos partes variadas do corpo, ora a força está centrada nas pernas e pés enraizados no chão, ora parece não haver força, apenas o peso do corpo deixando-se estar e deslizar através do outro.
Estes novos apoios, esta nova organização do corpo no momento do contato, após alguns minutos já permitem ao ator/bailarino se encontrar em outro estado, um estado em que há mais do que concentração, são dois corpos em sintonia total, que se entendem sem o uso de palavras. Assim acredito na possibilidade de esta prática levar o ator a um estágio de criação, de descoberta de momentos na concepção de um personagem, de uma cena, de uma encenação de um texto. Este é um dos meus desejos, descobrir como, e até onde, o contato pode ser utilizado na criação dramatúrgica do ator.
Na prática do contato/improvisação que venho desenvolvendo junto ao colega e ator André Macedo, há aproximadamente seis meses, percebo que muitos momentos, quando alcançamos determinado estado e concentração ao realizar os movimentos, vêm recheados de intenções, que poderiam ser transformadas em conformidade com um texto ou uma situação dramática. Há momentos de peso, de força, que remetem ao ódio, a desavenças, outros de leveza, de carinho, trazendo sentimentos de amor, de cuidado.
Nesta busca da utilização do contato na criação de cenas, começamos a utilizar textos dramáticos em determinado momento do trabalho. Nos encontros, que acontecem de duas a três vezes por semana, um é dedicado apenas a técnica, exercícios de apoios, rolamentos, pesos, no outro deixamos livre para o improviso, para a descoberta do contato, buscando encaixes dos corpos, transposições sobre o corpo do outro, apoios sobre o corpo, e em determinado momento, após termos tido bastante tempo para experimentações, trazemos um texto dramático, uma ou duas frases e, às vezes, alguma situação, que nos norteie, porém não nos prenda, é algo para ser utilizado, mas que vem para ser somado a prática do contato, não para romper com o que foi feito até o momento.
Explico melhor a inserção deste fragmento: um dos dois atores traz uma proposta de um pequeno fragmento de um texto dramático, a história geral do texto não é de conhecimento dos atores, ou não necessita ser, o que interessa é a frase escolhida, suas palavras e possíveis intenções. Repetimos algumas vezes o fragmento buscando decorá-lo, em seguida retornamos aos movimentos do contato, e aos poucos inserimos o texto. A partir daí nos deixamos bastante livres para experimentar, de acordo com nossa primeira idéia do que as palavras significam, e posteriormente aproveitando os estímulos do colega, algum movimento que sugere alguma intenção, etc.
Nesse jogo não há regras, por vezes o movimento leva a intenção dada ao texto, em outras é a palavras que conduz o movimento, e através da técnica do contato, dos apoios, do peso, da leveza, do chão e do ar, buscamos dar nova vida a um texto que pode ter diversas interpretações, que dependendo dos estímulos pode ter um ou outro significado, dor ou alivio, ódio ou amor.
A intenção inicial não era utilizar a técnica para criar um espetáculo ou algo parecido, em primeiro lugar levamos em conta a sensação, o estado corporal que a prática do contato/improvisação nos proporciona, esta, aliada ao trabalho do corpo, da agilidade, da força, do equilíbrio, da concentração que a prática exige, já eram, para nós, motivos suficientes para passarmos a desenvolver uma prática constante dos movimentos do contato. Com o passar do tempo percebemos uma resposta muito significativa, corporalmente falando ganhamos agilidade, força, e descobrimos um corpo muito mais vivo, mais ativo. Instigada por este ganho visível, passei a me questionar até onde, então, o contato poderia “me levar”, o que mais eu poderia agregar do contato ao meu trabalho de atriz, e do meu trabalho de atriz ao contato.
Tenho pensado muito na utilização do corpo, em toda a potencialidade do corpo em cena, em tudo que podemos utilizar e no quanto realmente utilizamos deste corpo em cena. Este é um questionamento de algum tempo, e acredito que a expressão corporal é o elemento chave do ator na atuação. Suzi Webber esclarece que

No teatro, a expressão corporal do ator é composta basicamente por movimentos, gestos, posturas, ações, atitudes. Este modo de expressão no teatro funciona como um sistema de significação não lingüístico – não verbal e não escrito. (WEBBER, p. 32).

Ao buscarmos colocar estes movimentos, gestos e ações em cena, muitas vezes percebemos que eles vêm carregados do “lugar-comum”, entendemos seu significado, mas achamos o movimento vazio, pobre, normal ou muito cotidiano. Desejando a possibilidade de ver o corpo expressando-se através das possibilidades de suas formas, o contato vem nos auxiliar a descobrir novos caminhos, a deixar de lado o usual, a inovar e arriscar.
Buscamos inserir na cena teatral a poesia, a simplicidade, a força e a beleza dos movimentos do contato, acreditando que

A simplicidade da forma do Contato Improvisação é uma dádiva. Seu valor é que ele é um modo de você e eu dançarmos juntos. Favorecendo as forças da gravidade e cinética é dançar com um senso de humor e constante humildade, é descobrir uma existência própria, é descobrir companheirismo verdadeiro. (LEPKOFF, 1976/77, p. 9).

E assim buscar levar essa dádiva, essa diversidade de sentimentos estimulados pelos movimentos do contato também para o público, buscando provocar no espectador, através dos movimentos a que ele assiste sensações mais profundas, através de ações e movimentos diferenciados, mas carregados de intenções, de sensações que possam ser despertas no outro que vê assim como foram despertadas em nós, atores, que descobrimos o movimento, o criamos, o pensamos, o executamos.


Referência Bibliográfica:

BARBA, Eugenio; SAVARESE, Nicola. A arte secreta do ator: Dicionário de antropologia teatral. Tradução Luís Otávio Burnier (Supervisão). Campinas, SP: Hucitec/Unicamp, 1995.
LEPKOFF, Danny. Contact Improvisation - A statement of appreciation. In: Contact Improvisation Source Book: collected writings and graphics from Contact Quaterly dance journal 1975-1992. Massachusetts: Contact Editions, 1997, p. 9.
WEBBER, Suzi. A expressão corporal revisitada. In: Porto e Vírgula, nº 24, p. 32-34.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

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